Umas, novas, Idéias

Wednesday, March 21, 2007

Peraí, que o negócio é sério!


"Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever.
No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo.
ele está cá dentro
enão quer sair.
Mas a poesia desse momento
inunda minha vida inteira."
Carlos Drummond de Andrade
Amigos que acompanham esse blog, estava preparando um texto para atualizar esta página, porém achei de bom grado compartilhar com todos que por aqui passam algo do senhor Octavio Paz, que, como diria o mestre Drummond, "vai devastando o Amazonas da minha ignorância." Trata-se de um trecho de O arco e a lira. Como o livro é esgotado há muitos anos e nem todo mundo tem, recortei um excerto da apresentação onde o autor discute a idéia de poema/poesia. Vou parando por aqui, por que o senhor Paz tem muito mais a falar que eu. Espero que lhes seja útil, como a vida.


"A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária por natureza; exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria outro. Pão dos eleitos; alimento maldito. Isola; une. Convite à viagem; regresso à terra natal. Inspiração, respiração, exercício muscular. Súplica ao vazio, diálogo com a ausência, é alimentada pelo tédio, pela angústia e pelo desespero. Oração, litania, epifania, presença. Exorcismo, conjuro, magia. Sublimação, compensação, condensação do inconsciente. Expressão histórica de raças, nações, classes. Nega a história, em seu seio resolvem-se todos os conflitos objetivos e o homem adquire, afinal, a consciência de ser algo mais que passagem. Experiência, sentimento, emoção, intuição, pensamento não-dirigido. Filha do acaso; fruto do cálculo. Arte de falar em forma superior; linguagem primitiva. Obediência às regras; criação de outras. Imitação dos antigos, cópia do real, cópia de uma cópia da Idéia. Loucura, êxtase, logos. Regresso à infância, coito, nostalgia do paraíso, do inferno, do limbo. Jogo, trabalho, atividade ascética. Confissão. Experiência inata. Visão, música, símbolo. Analogia: o poema é um caracol onde ressoa a música do mundo, e métricas e rimas são apenas correspondências, ecos, da harmonia universal. Ensinamento, moral, exemplo, revelação, dança, diálogo, monólogo. Voz do povo, língua dos escolhidos, palavra do solitário. Pura e impura, sagrada e maldita, popular e minoritária, coletiva e pessoal, nua e vestida, falada, pintada, escrita, ostenta todas as faces, embora exista quem afirme que não tem nenhuma: o poema é uma máscara que oculta o vazio, bela prova da supérflua grandeza de toda obra humana!
Como não reconhecer em cada uma dessas fórmulas o poeta que as justifica e que, ao encarná-las, lhes dá vida? Expressões do algo vivido e padecido, não temos outro remédio senão aderirmos a elas - condenados a abandonar a primeira pela segunda e esta pela seguinte. Sua própria autenticidade mostra que a experiência que justifica cada um desses conceitos os transcende. Será preciso, portanto, interrogar os testemunhos diretos da experiência poética. A unidade da poesia só pode ser apreendida através do trato desnudo com o poema.
(...)
Um poema é uma obra. A poesia se polariza, se congrega e se isola num produto humano: quadro, canção, tragédia. O poético é poesia em estado amorfo; o poema é criação, poesia que se ergue. Só no poema a poesia se recolhe e se revela plenamente. É lícito perguntar ao poema pelo ser da poesia, se deixamos de concebê-lo como uma forma capaz de se encher com qualquer conteúdo. O poema não é uma forma literária, mas o lugar do encontro entre a poesia e o homem. O poema é um organismo verbal que contém, suscita ou omite poesia. Forma e substância são a mesma coisa."
In: PAZ, Octavio. O arco e a lira. Rio de janeiro: Nova fronteira, 1982.

1 Comments:

  • At 4:05 PM, Blogger Unknown said…

    De um antigo caderno de anotações: “La poesía es una suerte de brujería evocadora que redime lo que toca al esperitualizarlo, que embellece la realidad al ajustarla a las exigencias de la métrica y de la rima, mediante el trabajo constante del autor. La ruina, la enfermedad, la muerte, el horror, el crimen, la marginácion, el anonimato, la miséria, la insignificancia revelan aspectos de la condición humana, y, por conseguinte, deben ser salvados de la zarpa del tiempo. La labor del poeta es ilimitada. Sua actividad es como la del sol que vivifica, vigoriza y rejuvenece. La poesía, sólo logra sumir al sujeito em un estado de embriaguez...”, a propósito da utilidade da vida.

     

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